sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

O Terminal



Era fim de ano, as duas amigas resolveram extrapolar e investiram suas economias numa breve viagem. Foi tomando uma cerveja que a idéia saltou à mesa. Mais tarde, as duas navegaram na internet fazendo simulações da tal viagem num site de “linhas aéreas econômicas”: partindo dos aeroportos mais próximos em diversas datas e chegando ao destino: Curitiba. Valor acessível e possíveis anfitriões conectados à rede mundial de computares insistindo por suas presenças naquele exato momento, a decisão não poderia ter sido diferente: decidiram que seria legal fazer uma viagem juntas, depois de tantos anos de amizade.
Uma tinha um primo na cidade. A outra, amigos. E as duas, convites dos dois lados. No dia seguinte compraram suas passagens e, no outro, acordaram cedo e pegaram uma carona com um casal de amigos até o Aeroporto Internacional de Congonhas em São Paulo. Vestidas com suas melhores roupas e munidas de malas recheadas de bugigangas e máquinas fotográficas, sentaram em suas poltronas e saborearam um suco de manga e uma barrinha de cereal, enquanto curtiam a linda paisagem da janelinha do avião, sentindo que eram as Divas do dia. Sim, afinal de contas, quantas vezes na vida, jovens mocinhas trabalhadoras resolvem que vão viajar de uma hora pra outra e simplesmente vão? Pois é! Para elas, não era todo dia que isso acontecia.
Ao meio dia, em cima de seus saltos altos, as duas Divas desembarcam no Aeroporto Afonso Pena, em Curitiba. Esperaram por suas malas e tomaram um lanche. Em seguida, uma ligou pro amigo e a outra pro primo. A notícia que tiveram com os telefonemas foi que o papel de Diva daquele dia começava a despencar: o amigo de uma estava em Londrina e o primo da outra não tinha como ir buscá-las, afinal, estava mais a pé do que as duas juntas.
Ok! Sem pânico! O amigo estava indo à Curitiba. Elas só não sabiam que esse filme iria durar nada mais, nada menos que míseras “cinco horinhas” dentro daquele simpático aeroporto.
Começaram olhando lojas, depois quiosques e livrarias. Saíam para a parte descoberta, admiravam o dia de sol e voltavam pra dentro. Andavam, subiam e desciam escadas rolantes. Entravam e saiam do banheiro. Conheceram todas as lojas e todos os quiosques do lugar. Decoraram todos os lançamentos da livraria, desde auto-ajuda até ficção científica. Restaram então os balcões de companhias aéreas, afinal, que mal tinha em comparar preço, mesmo sabendo que as passagens de volta já estavam devidamente reservadas e pagas?
A elegância de suas roupas começou a incomodar: tudo o que elas queriam eram tênis e camisetas. Os sapatos então passaram a ser seus piores inimigos. O carrinho com as malas começou a puxar pra um dos lados, devia estar precisando de óleo nas rodinhas. As duas revezavam a vez de empurrá-lo, já não agüentando mais. Andando pra cima e pra baixo, encontraram a “Lan House” da Infraero e, para a felicidade das amigas e alegria geral da vizinhança infantil do aeroporto, o acesso à internet era de graça. Revezando os computadores de vinte em vinte minutos com a criançada, elas acessaram e-mail, orkut e afins. Sentaram nas poltronas, usaram a mesa, conversaram, cochilaram, e já sentindo que faziam parte do lugar, deixaram a educação meio de lado pra fazer cara feia pras crianças que passavam dos vinte minutos em frente ao computador. Enquanto esperavam a próxima “acessada”, voltavam às poltronas, aos cochilos, às conversas, até que tudo aquilo foi ficando monótono demais e resolveram fazer suas unhas. É! A sala de acesso à internet da Infraero se transformou por alguns minutos em salão de beleza. E não levou muito tempo pras duas se sentirem em casa: já imaginavam uma toalha na mesa, uma decoração diferente e discutiam sobre esse assunto, enquanto faziam barquinhos de papel com folhetos turísticos pra enfeitar a mesinha de centro que estava muito vazia. Já imaginavam passar os dias por lá mesmo e receber os amigos ali. Só precisavam de uma cafeteira pra poder servir algo quando chegassem.
Cansadas do novo lar, deram mais uma volta pela “vizinhança”. Os funcionários do aeroporto já sorriam pra elas como se fossem velhos amigos, enquanto algumas balconistas olhavam desconfiadas tentando entender o que aquelas duas paulistas faziam ali desde a hora do almoço.
Batendo perna aqui e ali, viram adolescentes modeletes altas, magras, loiras de olhos azuis, além de atores globais, turistas, pessoas com roupas duvidosas e então começaram a enlouquecer. Saíram para tomar um ar, sentindo que já havia passado muito tempo, tanto tempo que uma delas, no auge de sua juventude, com seus apenas vinte e sete anos, soltou uma frase inesperada e imprópria: “quando eu era jovem”. Foi aí que a outra amiga percebeu que aquela aventura já estava indo além de suas expectativas. Não tinham muita alternativa e então voltaram à livraria. Viram preços de pilhas e perguntaram quanto custava um banho e uma cama, mas resolveram continuar andando. Devem ter andado quilômetros naquele dia. Quando já estavam apegadas demais ao lugar, levando em consideração as cinco longas horas de histórias e experiências que haviam vivido por lá, o amigo, que elas já nem se lembravam mais, ligou dizendo que estava esperando as duas do lado de fora.
Hoje, “O Terminal” é o filme preferido delas.
Pois é! O dia de Divas foi acabando junto com a paciência que elas tinham. Não só a paciência, mas o dinheiro também. Na volta, pegaram metrô, ônibus, carona e só restaram vinte reais pra cada, que gastaram com a revelação das fotos (é, elas não tinham máquina digital) e com um lanche.
Mas o passeio e a hospitalidade foram incríveis. Uma semana depois, as meninas foram a uma adega comprar um vinho para agradecer aos anfitriões. Num meio de semana qualquer, no horário de almoço, elas provaram todos os vinhos possíveis e imagináveis com o objetivo de escolherem o melhor... Mas essa história é longa e vai ficar pra próxima postagem.


Ah! Obrigada à Giselly, Bóris, Billy (o cão) e Raphael, por terem contribuído para tornar essa história real.